Eliane encenou ao lado de Andréa Beltrão e Ana Beatriz Nogueira a peça "A memória da água". Relembramos esse espetáculo através da Matéria publicada no 'Jornal da Tarde' no dia 11 de janeiro de
2002, Caderno C - Variedades.
Três irmãs abertas para balanço
Andréa Beltrão, Eliane Giardini e
Ana Beatriz Nogueira são estrelas de “A memória da água”, peça da inglesa
Shelagh Stephenson, que mostra três irmãs reunidas para organizar o velório da
mãe e, principalmente, prestar contas com um passado diferente para cada uma
delas.
André Nigri – Jornal da Tarde
“Eu acho que as suas memórias não são as mesmas que as
minhas” diz uma das irmãs na peça “A memória da água”. No texto da autora
inglesa Shelagh Stephenson, cada uma das protagonistas possui uma versão
diferente do passado, embora as três irmãs tenham crescido juntas na mesma
casa.
No começo da peça que
estreia em São Paulo hoje- depois de uma temporada de sucesso no Rio-
elas estão reunidas para organizar o funeral da mãe na casa onde passaram a
infância e a adolescência. Ali elas dão inicio a uma espécie de balanço emocional de
suas vidas provocado pela morte de sua mãe, elemento que as mantinha unidas.
É esse, em resumo, o enredo de “A Memória da água”, a mais
recente montagem dirigida pelo carioca Felipe Hirsch- autor e diretor entre
outras, A Vida é cheia de Son & Fúria, inspirada no romance Alta
Fidelidade”, de Nick Hornby.
Mais uma vez Hirsch recorre a um texto estrangeiro para
investigar os caprichos da memória e o uso que dela as pessoas fazem para
reconciliar-se com o passado e restaurar o equilíbrio no presente.
Em cena Andréa Beltrão é o destaque do elenco no papel de
Maria, uma médica neurologista de 38 anos, inteligente, fria e que mantém um caso
com um colega casado. Por seu desempenho a atriz foi indicada para os prêmios
Governador do Estado e Shell.
Maria, a filha mais sensível à desestrutura familiar, foi o
maior desafio de sua carreira: “Jamais fiz um personagem com tamanha
densidade. Pensava que não ia conseguir”.
Se Maria é a irmã visitante, Teresa, vivida por Eliane
Giardini, é a residente, a que nunca se afastou da cidadezinha à beira-mar onde
nasceu. Ficou para cuidar da mãe e tocar um casamento em crise. É, das três, a
que retém mais vivas as lembranças da casa, mas é a menos bem-sucedida.
Completa o triângulo Catarina (Ana Beatriz Nogueira), a
caçula rebelde, incomunicável em seu discurso de “patinho louco” da família.
Se a memória é tema recorrente no teatro de Hirsch, alguns
elementos cênicos já utilizados por ele estão de volta em “A Memória da Água”.
Uma tela transparente separa o palco da plateia provocando o efeito de uma
neblina no olhar, assim como a projeção de imagens com influências de Stanley
Kubrick e Ingmar Bergman.
A água não está apenas presente no título. Sua presença é
constantemente evocada. Uma das personagens explica que a água é um elemento
capaz de reter, como uma fita magnética, os agentes com que entra em contato
quando se registra uma mistura.
Mas ao mesmo tempo a água é sempre uma ameaça por sua força
diluidora e destrutiva. Como metáfora e como presença real, os personagens
estão ameaçados. A casa onde preparam o cadáver da mãe para a cremação está
rachando, e como está debruçada em um penhasco sobre o mar, seus alicerces
podem ser derrubados pela força das ondas.
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