Em Entrevista, ao jornalista Júlio Gama do jornal Estado de São Paulo, no dia 06 de Junho
de 1993 Eliane Giardini e Paulo Betti faziam a referência de seus personagens
nas Novelas Renascer e Mulheres de Areia.
Segue, abaixo, a entrevista na íntegra....
Na casa do cafajeste das seis, Dona Patroa é quem manda
Eliane Giardini e Paulo Betti, a
Dona Patroa de Renascer e o Wanderley
de Mulheres de Areia, se apaixonaram
e começaram a namorar em Sorocaba, Interior de São Paulo, quando ela entrou
para o grupo de teatro dele. Foi atração á primeira vista e os dois achavam que
o romance acabaria logo. Há mais de 20 anos, convivem com a iminência da
separação, como contam divertidos e muito a vontade. Embora as diferenças sejam
motivo de discussões, eles creditam a elas a durabilidade do casamento. Eliane
é estudiosa, caseira. Paulo, como ele mesmo se define, mais exibido. Ela lembra
detalhes das duas décadas a dois. Como quando o marido disse que não estava preparado
para ser pai e ela tascou: “já foi”. Nasceu Juliana, de 16 anos. Quatro anos depois, Mariana, a segunda filha.
Hoje Paulo quer um filho homem. Ela não.
Telejornal: Como foi o primeiro encontro?
Eliane Giardini: Foi em Sorocaba, em 1970. O Paulo fazia parte
de um grupo de teatro. Eu voltava de uma filmagem na Paraíba, fui convidada
para entrar no grupo e nos conhecemos.
Paulo Betti: A
Eliane era uma estrela de cinema em Sorocaba por causa desse filme na Paraíba.
Telejornal: Quando começou o namoro?
Paulo: Imediatamente,
eu era a pessoa mais interessante do grupo.
Eliane: Eu também
(risos).
Paulo: A gente se
entendeu, digamos sensualmente mais rápido, foi uma atração que bateu e não
parou até agora. Nossa relação é muito proveitosa, há um estímulo de
crescimento.
Eliane: É um
movimento circular, feito as quatro estações. Quando um está fazendo muita
coisa fora, o outro está aqui dentro estimulado com outro tipo de trabalho. São
movimentos antagônicos mas complementares.
Telejornal: mas agora o Paulo está no teatro e em Mulheres de Areia, e
você faz sucesso com a Dona Patroa, de Renascer,
Eliane: Estou num
movimento exterior, primeira novela das oito, o reconhecimento. O Paulo quer
estudar, pagar uma bolsa nos estados Unidos, está numa fase de se realimentar.
Também tem o fato de temos nos conhecido muito novos com 16,17 anos...
Paulo: Não não.
Eliane: Claro,
Paulo, foi em 70..
Paulo: Não,
tínhamos 19 anos.
Eliane: Bom, não
sei. Éramos muito novos de qualquer forma.
Paulo: Temos um
trajeto muito parecido, fomos juntos para a Escola de Arte Dramática da USP,
tínhamos a mesma idade, vimos as mesmas coisas e ao mesmo tempo mantivemos a
individualidade. A Eliane é mais introspectiva e eu extrovertido.
Telejornal: Do namoro para o casamento quanto tempo passou?
Eliane: Casamos um
ano depois do inicio do curso da USP.
(A gata siamesa “ Mãe” entra)
Paulo: Ela não gosta da gata.
Eliane: Não é que
eu não goste. Ela apareceu prenha, já teve filhotes duas vezes e agora deu de
arrebentar os móveis. Me irrita. Está destruindo essa poltrona que acabou de
ser estofada.
Paulo: Precisa
forrar as poltronas. A gata é linda, maravilhosa.
Eliane: a gente
tinha uma cachorra que morreu. Eu estava acostumada com ela e aparece essa gata
que não obedece, você chama, ela fica olhando com cara de tonta.
Paulo: Acho que
você deveria gostar mais de gato, Eliane.
Eliane: Ah, você
acha?
Telejornal: Bem, depois do casamento, vieram as filhas. Foi decisão dos
dois?
Eliane: Não, o
Paulo foi à reboque. Ele me joga para o mundo exterior e eu jogo ele para
dentro de casa com o casamento e os filhos. O Paulo disse que não estava preparado
para ser pai e eu disse: já foi.
Paulo: Mentira.
Não lembro, mas acho que não foi assim. Tanto que agora quero ser pai
novamente.
Eliane: Mas agora
eu não quero.
Paulo: Quero ter
um filho homem, acho importante perpetuar meu nome, ter um herdeiro (risos).
Telejornal: E com a segunda filha?
Eliane: Foi a
mesma coisa.
Paulo: Ah, mentira
sua, Eliane.
Eliane: Paulo,
para de onda.
Paulo: (rindo)
Sabe qual é o problema de um casamento antigo? É que você não grava as coisas. Vai ver que eu é quem queria
ter os filhos e não lembro.
Eliane: Eu lembro
direitinho.
Telejornal: Vocês casaram na igreja?
Paulo: Casamos.
Eliane: Por causa
da minha mãe.
Paulo: É que a
gente era muito babaca, tinha uma caretice. Por exemplo, não batizamos as
crianças, hoje acho isso uma bobagem.
Eliane: Não acho.
Paulo: Pensamos:
vamos esperar elas quererem ser batizadas. Naturalmente, estamos batizando as
duas hoje com um padre amigo.
Telejornal. As diferenças ajudam a manter o casamento?
Eliane: Eu acho
que sim. A psicologia explica. A relação acaba completamente quando um não mais
está espelhando para o outro nenhuma ansiedade ou inquietação.
Paulo: Não digo
que seja esse o motivo e não saberia dizer qual é, mas tenho alguém em quem
confio no gosto, na autenticidade.
Telejornal: Quem é mais crítico quanto ao trabalho do outro?
Paulo: Muitas das
coisas que faço passam pelo crivo da Eliane. Isso dá uma segurança incrível. É bom.
Eliane: Para mim
também. Confio muito no julgamento dele.
Paulo: Acabei de
estrear Viagem à Forli e passamos seis horas conversando sobre a peça. Aceitei
todos os toques que achei justo. Alguns são a diferença mesmo. Tipo: Isso vou
continuar fazendo assim porque é assim.
Eliane: Temos uma
crítica eterna. O Paulo acha que faço blasé demais. Meu defeito, digamos, é não
fazer. Acho o máximo da sofisticação. O defeito dele é o contrário: Faz muito
blasé. Eu falo: Está fazendo muito. Ele fica louco. Quando ele fala 'Está fazendo pouco', acho que ele não esta vendo o grande lance da minha interpretação.
Telejornal- Dona Patroa está na
medida?
Paulo: Acho que sim. E muito bom o trabalho dela. As
pessoas tiveram um pouco de dificuldade em perceber a atriz que ela é, porque
eu fico soltando foguetes em volta, fazendo barulho feito um macaco, enfim,
fazendo uma onda danada e talvez tenha jogado uma sombra na carreira dela. Mas
era impossível o grande público não enxergar o trabalho da Eliane. Falo de TV.
No teatro ela tem uma carreira sólida.
Eliane. A novela
Renascer é especial porque privilegia o
ator, mas em geral a TV vive muito de
burburinho, de festas, e eu sou avessa à badalações, adoro ficar lendo em
casa, martelando meu piano. Essa coisa de que o auge e o camarote da Brahma no
carnaval não é comigo.
Paulo: Apareci
mais na mídia por causa da militância do PT.
Eliane: Militante
eu nunca fui.
Telejornal. Quem se dá melhor com as crianças ?
Paulo: A Eliane.
Ela acompanhou mais o crescimento das crianças. Isso é uma falta que sinto.
Eliane: Nesses dez anos em que elas cresceram, você esteve
muito fora. Quando estava em casa, estava debruçado sobre um texto.
Telejornal Quem e o mais ciumento?
Eliane: eu sou
mais dona (risos)
Paulo: às vezes
tenho ciúme, mas me controlo.
Eliane: Eu
melhorei. Hoje não sou tão ciumenta.
Paulo : Imagina
se não.
Telejornal O ciúme é resolvido em casa ou com um beliscão no meio da
rua?
Eliane: É na hora.
E só perceber que ele esta mais entusiasmado que já digo: Pô, qual é?
Paulo: Às vezes não é bem o entusiasmo que demonstro...
Eliane: Acho que
fui mais ciumenta em virtude da pouca satisfação profissional. Você fica com
inveja, vê a pessoa se relacionando com todo mundo. É ciúme da posição e não dele
em si. Nunca me contentei em ser dona de casa. Queria uma produção minha e, no período
em que não tive, era natural que ficasse em cima dele.
Telejornal: Quem é o mais apaixonado?
Eliane: nenhum...
Paulo: Acho que a
Eliane é mais preguiçosa.
Eliane: o que você
quer dizer?
Paulo: Não. Não
tem nenhum problema. O que há é que a gente estáa sempre querendo transformar o
outro e enquanto a gente achar que isso é possível a gente fica junto.
Telejornal: Vocês brigam sempre?
Eliane: Muito a
coisa vai lá em cima por uma bobagem. É tudo muito dramático, muito italiano. Mas
acaba rapidamente.
Paulo: o dia a dia
nunca é estimulante. Você acaba despejando no outro uma insatisfação momentânea
provocada pelo exterior. Ainda não temos imunidade para separar as coisas. Mas
estamos evoluindo.
Telejornal: Em mais vinte anos vocês chegam a perfeição?
Eliane: (rindo)
Ah, meu Deus, mais vinte anos é fogo. Acho que se tivesse morado sozinha uns três
anos, eu não casaria. Mulheres separadas há quatro anos dizem que não querem
saber de homens. Eles chegam em casa jogando sapato, cueca. Não dá.
Telejornal: Já pensaram em casas separadas?
Eliane: Várias vezes. Por isso. O Paulo ocupa muito espaço, fica no
telefone o dia inteiro falando alto. Ainda bem que ele passou a ficar a maior
parte do tempo na Casa da Gávea (espaço Cultural do qual é presidente). O Paulo
fica assim: Cadê aquele negócio meu. Ele quer na hora e todo mundo tem que
largar o que está fazendo para procurar o negocio do Paulo. Cara, é um inferno.
Telejornal: É Paulo?
Paulo: Existem
certos exageros...
Eliane: Ele fica
bravo quando digo que fala alto ao telefone.
Paulo: Eu não acredito
no aparelho. Eu acho que a pessoa não está me ouvindo de verdade (risos).
Telejornal: O Paulo é do tipo que respinga pasta de dente no espelho do
banheiro?
Eliane: Isso não,
mas papel...nós vamos ser soterrados por papel nessa casa. Eu preciso arrumar
tudo para achar um cantinho para guardar minhas coisas porque ele ocupa tudo.
No resto, é cuidadoso.
Paulo: Por outro
lado sou muito estimulante.
Eliane: A Eva
Wilma está ensaiando uma peça dirigida pelo Paulo e me disse: “ Eliane, não sei
como é para você, mas encontrei o diretor da minha vida”.
Telejornal: o que é
um bom motivo para vocês brigarem?
Eliane: é quando o
Paulo chega e fala: Não trocou essa lâmpada ainda? quando uma lâmpada está há
uma semana queimada. Ele chega com uma cara tipo: O que você fez até hoje que
não trocou essa lâmpada. Isso me deixa louca.
Paulo: Casal tem a
coisa do “precisa”: precisa fazer isso, aquilo. Alguém tem que fazer alguma
coisa...
Eliane: Ele está
com o telefone na mão e diz: Precisa ligar para o cara do cupim. Digo que ele
está com o telefone e ele: Você quer que
eu faça isso também.
Telejornal: Quem é a dona Patroa e o Wanderley do casal?
Eliane: O Paulo não tem nada a ver com o Wanderley. Eu tenho
proximidade com a dona Patroa. Nós duas estamos ganhando nome ao mesmo tempo:
Dona patroa começa a ser chamada pelo nome de Iolanda, e as pessoas começam a
saber quem eu sou. A Dona Patroa é uma pessoa da sombra que está buscando a
luz. Isso é muito parecido com a minha trajetória profissional.
Telejornal: Vocês já fizeram TV juntos?
Eliane: Fizemos um
Você Decide.
Telejornal: Preferem trabalhar juntos ou separados?
Paulo: Junto é
gostoso, mas separado é melhor: rende mais assunto e dá uma folga. E outra: na coisa de criar, gosto que a
Eliane veja, mas quero surpreender também.
Telejornal: Qual é o melhor trabalho da Eliane?
Paulo: Na Carreira
do Divino, peça que deu origem ao filme Marvada Carne.
Telejornal: E do Paulo...
Eliane: Viagem à Forli.
Paulo: o meu
melhor sempre é o ultimo (risos).
Eliane: Você é horrível,
Paulo. Está competindo muito comigo.
Paulo: é que eu
era muito medíocre como ator. Estou Melhorando.
Eliane: Também
acho.
Paulo: Estou
ouvindo mais os conselhos da Eliane. Antigamente andava em cena, parecia que havia
tomado um choque elétrico.
Telejornal: O amor é eterno
enquanto dura, ou se acaba não era amor?
Eliane: Se acaba
não era amor. É quase impossível: Estamos indissoluvelmente ligados, vivemos
juntos mais tempo do que sozinhos. São 22 anos com o Paulo e 18 sem ele.
Paulo: Acho que o
amor tem fim.
Telejornal: Vocês trocam presentes no dia dos namorados?
Eliane: Não me
lembro
Paulo: não, a
gente tenta diariamente ser legal um com o outro.
Telejornal: Qual é a formula para manter um casamento de 20 anos?
Paulo: o interesse
maior não pode ser construir uma relação. Se você se preocupar com o individual
e com o seu crescimento, com as coisas de que você gosta, e conseguir associar isso
convivendo com outra pessoa, dá pé.
Eliane: é isso. O Sonho
não pode ser o casamento. Não pode estar fora de você.
Paulo: o mais
importante é que nós acreditamos que nossa relação está viva e achamos isso
bom. Se chegarmos a conclusão de que não vale mais a pena, então devemos tomar
uma atitude. E outra, a gente se pergunta isso todo dia.
Eliane: é toda
briga acaba nisso.
Paulo: A gente
fala: Vamos nos separar agora, mas será que dá pra fazer a peça antes. A
gente constrói tudo junto, mas na iminência de poder acabar agora.
Telejornal: Isso é ruim?
Paulo: é inevitável.
É assim que é e sempre foi. Nunca falamos Vamos ficar juntos por toda a vida.
Nunca tivemos sequer conta conjunta em banco.
Telejornal: Já se separaram?
Paulo: Já, ficamos
um ano separados, e foi muito engraçado
porque tínhamos acabado de sair de um programa de TV onde fomos contar como era
um casal feliz. Cascateamos o tempo inteiro que vivíamos felicíssimos, saímos
dali, brigamos e nos separamos.
Telejornal: Se vocês brigarem até dia 06 me avisem?
Paulo: você está
nos entrevistando com muita antecedência (risos)
Eliane: É
arriscado...